O vice-presidente Hamilton Mourão afirmou que o governo precisa “saber trabalhar com as peças que estão aí no tabuleiro” ao comentar o apoio do Palácio do Planalto ao deputado federal Arthur Lira (PP-AL), eleito, na segunda (1º), novo presidente Câmara.
Mourão fez a declaração ao ser questionado por jornalistas se esse apoio do governo gerava algum tipo de constrangimento, já que houve oferta a deputados de cargos e emendas em troca de votos em Lira, candidato que foi aliado do ex-deputado Eduardo Cunha e que foi denunciado por corrupção passiva pela Operação Lava Jato.
“Essas coisas não passam por mim. […] Quando o presidente não fez ligação com o Congresso, ele não estava indo bem porque não tinha ligações com o Congresso. Agora ele tem ligações… E, aquela história, a gente tem que saber trabalhar com as peças que estão aí no tabuleiro”, afirmou Mourão.
Lira foi eleito em primeiro turno para presidir a Câmara pelos próximos dois anos. O deputado, que está no terceiro mandato, lidera o “Centrão”, bloco de partidos conhecido por oferecer apoio a governos em troca de cargos.
Lira contou com apoio declarado do presidente Jair Bolsonaro, que antes criticava o “Centrão” e o chamado “toma-lá-dá-cá”, como é chamado o apoio político em troca, por exemplo, de cargos no governo.
Nos bastidores, espera-se que a vitória de Lira leve o presidente a fazer uma reforma ministerial para contemplar os partidos de sua base.
Denúncia na Lava Jato
Arthur Lira e outras quatro pessoas foram denunciadas em junho de 2020 pela PGR em uma investigação que tramita no STF. O deputado é acusado por corrupção passiva dentro da operação Lava Jato.
Segundo os investigadores, o parlamentar recebeu R$ 1,6 milhão em propina da empreiteira Queiroz Galvão. A denúncia ainda não foi analisada. Se for aceita pelos ministros do tribunal, abre-se uma ação penal e Lira se torna réu.
Em outro processo, a Segunda Turma do STF decidiu em junho de 2019 aceitar a denúncia do Ministério Público contra Lira e outros três parlamentares do PP por organização criminosa. Eles são acusados de desviar dinheiro da Petrobras no esquema investigado pela operação.
Em nota, a assessoria de imprensa do deputado disse que “todos os processos que vieram a julgamento na Lava Jato foram arquivados e os próximos devem ter o mesmo desfecho”.
“Três processos no STF foram arquivados e, no quarto processo, a própria Procuradoria-Geral da República pede o encerramento. Em outro, a acusação nem sequer possui amparo legal válido para o período questionado”, afirmou em nota.
Desdobramento da Lava Jato (caso CBTU)
Em outubro de 2019, a 1ª turma do STF recebeu denúncia contra Lira e o tornou réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em um desdobramento da operação Lava Jato. O caso ainda não foi julgado.
A PGR acusou o deputado de aceitar propina de R$ 106 mil do então presidente da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), Francisco Colombo, em troca de mantê-lo no cargo.
Sobre este processo, o deputado respondeu que “não há nexo entre a temporalidade da suposta irregularidade e a cronologia dos acontecimentos”.
Operação Taturana
Lira foi investigado por suspeita de participação em um esquema de desvio de dinheiro da Assembleia Legislativa de Alagoas. Ele foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2018 por peculato e lavagem de dinheiro.
De acordo com a procuradoria, a fraude se dava a partir da apropriação de parte dos salários de funcionários e também da inclusão de falsos funcionários na folha de pagamento. Eles repassavam, segundo a denúncia, parte do dinheiro dos salários aos deputados ou a pessoas indicadas pelos parlamentares.
Este caso deu origem a um processo cível, no qual Lira já foi condenado por improbidade administrativa. Ele recorre da decisão. Em relação à parte criminal dos fatos investigados na operação Taturana, Lira foi absolvido em dezembro de 2020, mas o Ministério Público em Alagoas recorreu da decisão.
Em relação a este caso, a assessoria do deputado reforçou que a Justiça de Alagoas anulou o processo e o absolveu sumariamente.
“Segundo a decisão judicial, mesmo sendo advertidos por escrito pelo STF e Receita Federal, os investigadores mantiveram vício na apuração de suposta irregularidade na Assembleia de Alagoas. Nesse foro, onde, de fato, foi processada a Operação Taturana também não há nenhuma acusação vigente contra o deputado”.
Queixa-crime
Lira é alvo ainda de uma ação apresentada pela ex-mulher, Jullyene Cristine Santos Lins, no STF. Ela pede a abertura de uma investigação e a condenação do deputado por injúria e difamação em razão de declarações dadas pelo parlamentar à revista “Veja”.
Lira afirmou que Jullyene “é uma vigarista profissional querendo extorquir dinheiro, inventando histórias”, ao comentar as acusações da ex-mulher de que ocultou patrimônio e começou a receber propina quando era deputado estadual em Alagoas. Na ação, a defesa argumenta que a fala buscou manchar a imagem da ex-mulher.
O relator, ministro Luís Roberto Barroso, decidiu que quem deve analisar o caso é o Juizado de Violência Doméstica de Brasília. A defesa de Lira recorreu para tentar manter o caso no STF ou enviá-lo à Justiça de Alagoas.
Violência doméstica
Lira respondeu ainda a processos por lesão corporal e ameaça, oriundos de acusações feitas por Jullyene à polícia em 2006 e 2007, quando ainda era deputado estadual em Alagoas.
Em novembro de 2006, Jullyene disse à Justiça que foi agredida por Lira “com tapas, chutes, pancadas” e que foi arrastada pelos cabelos dentro de sua própria casa. Segundo Jullyene, Lira foi cobrar explicações sobre um novo relacionamento que ela mantinha após o fim do casamento.
O caso tramitou na justiça alagoana e chegou ao STF em 2011, porque Lira ganhou foro privilegiado. Ao STF, Jullyene mudou de versão. Disse que Lira não a havia agredido e o deputado foi absolvido do crime de lesão corporal em setembro de 2015. Em entrevista à “Folha de S. Paulo”, Jullyene disse ter sido coagida pelo deputado a mudar o depoimento.
Jullyene voltou à polícia em julho de 2007, quando disse ter sido ameaçada por Lira. O deputado teria dito à babá que os dias da ex-mulher estavam contados. A Justiça decretou medidas protetivas para afastar Lira da ex-mulher e o deputado chegou a ser preso em abril de 2008 por coação à administração da Justiça no curso do processo.
Em 2015, os ministros do STF reconheceram a prescrição do crime de ameaça, que é a perda do direito do estado de punir o cidadão, por não cumprir o prazo previsto em lei para questionar a irregularidade.
Em relação aos processos envolvendo Jullyene, o deputado disse que “lamenta o uso político de denúncias que já foram arquivadas em processos anteriores e não comentará as acusações requentadas em respeito a seus filhos e familiares”.